terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

A gripe “anti-crucifixos” e a Revolução Universal.

Fernando Rodrigues Batista

“Há que proclamar Cristo acima dos punhos crispados dos verdugos, acima dos suspiros da besta infernal da perseguição”.


O decreto n. 7.037/2009 que aprovou o malfadado Plano Nacional de Direitos Humanos vem suscitando debates calorosos a respeito de vários de seus pontos. Todavia, salvo poucas exceções, a análise do malogrado documento é feita de forma fragmentária, olvidando-se sua essência, vale dizer, seu caráter notadamente anti-católico.

Esse caráter anti-católico fica evidente no “objetivo estratégico VI” do PNDH atinente ao “respeito às diferentes crenças, liberdade de culto e garantia da laicidade do Estado”.

Inicialmente calha ressaltar que esta ofensiva contra a tradição cristã de nossa Pátria e contra os valores basilares do cristianismo possui amplitude universal.

Em 4 de novembro de 2009 o Tribunal de Direitos Humanos de Estrasburgo deferiu o recurso apresentado por Soile Lautsi, cidadã italiana de origem finlandesa, que em 2002 havia pedido ao instituto estatal italiano em que estudavam seus dois filhos que retirassem os crucifixos das salas de aula.

A sentença prolatada pelo Tribunal de Estrasburgo – embasada por sua vez no Pacto de Lisboa - assegura que os crucifixos nas salas de aula constituem “uma violação dos direitos dos pais de educar seus filhos segundo suas convicções” e da “liberdade de religião dos alunos”.

A conferência episcopal italiana falou de “visão parcial e ideológica”, ressalvando que na decisão do tribunal “se ignora ou se descuida do múltiplo significado do crucifixo, que não é só símbolo religioso, senão também cultural”. Ademais, enquanto o Governo italiano anunciou que apresentou recurso contra a sentença, o mundo político manifestou quase unanimemente a falta de senso comum que embasa a medida, assinalando como “a laicidade das instituições é um valor muito distinto da negação do papel do cristianismo”.

De fato, a sentença do Tribunal de Estrasburgo, com a intenção de tutelar os direitos do homem, acaba por colocar em julgamento as raízes sobre a quais se fundam esses mesmos direitos, desconhecendo a importância do papel da religião – e em particular do catolicismo – na construção da identidade européia. Por outro lado, a decisão vem reafirmar antiga idéia naturalista – condenada por São Pio X - quando afirma a centralidade do homem na sociedade substituindo a Deus.

Os efeitos da decisão supradita não demoraram, e assim, com o apoio do PSOE (Partido Socialista “Obrero” Espanhol), a Comissão de Educação e Esporte do Congresso espanhol aprovou dia 2 de dezembro de 2009, por 4 (quatro) votos de diferença, uma proposta de lei, apresentada pela ERC (Esquerda Republicana da Catalunha), a qual visa forçar o Governo a aplicar em todos os centros escolares a jurisprudência do Tribunal de Direitos Humanos de Estrasburgo.

Cabe lembrar que na Espanha da Segunda República, no governo da Frente Popular onde 90% dos ministros eram maçons, o anticlericalismo se fez apresentar desgraçadamente. Neste governo se aprovou uma Lei para a expropriação de todos os bens das Igrejas. Também se criou uma lei através da qual se proibia a docência aos sacerdotes e nas escolas os crucifixos deveriam ser eliminados das salas de aula. Em face disso, o consagrado escritor Miguel de Unamuno detectava muito bem a raiz destas invectivas com palavras que se adequam perfeitamente aos dias de hoje:

“A presença do Crucifixo nas escolas não ofende a nenhum sentimento nem ainda ao dos racionalistas e ateus; e ao retirá-lo ofende ao sentimento popular até dos que carecem de crenças confessionais. O que se vai colocar onde estava o tradicional Cristo agonizante? Uma foice e um martelo? Um Compasso e um esquadro? Ou que outro símbolo confessional? Porque há que dizer claramente e disso teremos que ocupar-nos: a campanha é de origem confessional. Claro que de confissão Anti-Católica e Anti-Cristã. Porque de neutralidade é um engodo”.

A gripe “Anti-crucifixos” de que padecia a mãe italiana que negava que seus filhos estudassem em uma sala de aula com um símbolo religioso contagiou a esquerda da Espanha, ainda que isso não seja nada novo. Desde que o Governo de Zapatero assumiu o poder em 2004, tudo relacionado a religião, a família cristã, a vida desde a concepção, a liberdade de ensino, tem sido objeto de uma continua ofensiva.

A gripe não apenas atingiu a esquerda espanhola, mas também a brasileira, uma vez que não outra coisa objetiva o governo petista ao prescrever como ação programática do PNDH “desenvolver mecanismos para impedir a ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União” com a finalidade de promover a “tolerância” e a “afirmação da laicidade do Estado”.

Conforme salientou Dalmacio Negro, catedrático espanhol e membro da Real Academia de Ciências Morais e Políticas, “as principais características do laicismo são o culto ao Estado e a ideologia progressista nihilista”.

Laicismo, diz o Dicionário de Política do saudoso jusfilósofo paulista José Pedro Galvão de Sousa, é uma “concepção filosófico-política que se assenta em radical indiferença à religião positiva e leva a pensar e agir como se Deus não existisse, fazendo-se valer essa atitude especialmente no âmbito das instituições públicas e da educação”.

No mesmo sentido, anota o jurista espanhol Miguel Ayuso, catedrático de Ciência Política e Direito Constitucional da Universidade Pontificia de Comillas e presidente da União Internacional de Juristas Católicos, que o termo laicismo denota o sufixo “ismo”, ligado a uma ideologia, a liberal, baseada na marginalização da Igreja das realidades Humanas e Sociais, vale dizer, supressão da Realeza Social de Cristo. Com efeito, o naturalismo racionalista posto em ação na Revolução liberal, e condenado pelo magistério da Igreja, recebeu entre outros o nome de laicismo.

Na prática, assevera ainda Miguel Ayuso, o que se está postulando é o agnosticismo político, que não pode se concretizar senão exigindo a submissão da Igreja (prévio esquecimento de sua missão de garante dessa ortodoxia pública) ao Estado: a “laicidade do Estado” sempre termina na “laicidade da Igreja”, vale dizer, na pretensão de que esta renuncie sua missão e se limite a oferecer seu “produto” (pura opção) dentro do respeito às regras do “mercado”.

Assim, a invectiva governamental pretende entregar a obra fundadora do catolicismo ao jugo da Revolução Universal, uma “potência anônima, ideológica, desencarnada, despersonalizadora” sobre a qual “o Estado absorve a Pátria”

Nossa época sofre de uma enfermidade predominante, e essa “enfermidade social” se chama laicismo. A natureza desta enfermidade já observava com sua habitual e peculiar lucidez o filósofo italiano Michele Federico Sciacca:

“O laicismo moderno, pura ou implicitamente desde seus primórdios, e ainda quando não o proclame abertamente, obedece a um princípio que, mais que uma abstração, diríamos que é uma superstição por um ídolo que lhe é essencial: o homem basta a si mesmo, e o mundo humano tem em si mesmo seu próprio princípio e seu próprio fim: é auto-suficiente. [...]. Concepção laicista da vida que significa, pois, concepção arreligiosa, humanismo absoluto, mundanismo radical; que tem por norma própria: pensar (ordem intelectual) e agir (ordem prática) como se Deus não existisse, deixando-o de lado na espera de anular sua mais distante imagem. Primeiro, destruição; logo, desprezo; por fim, radical esquecimento” (SIACCA, Michele Federico. “El laicismo, crisis de fe y de razón”, en La sociedad a la deriva. Actas de la XIV Reunión de Amigos de la Ciudad Católica, 6 al 7 de diciembre de 1975, Speiro, p. 224.)

Monsenhor Berataud, com acuidade escrevia que “não há direitos a proscrever o sobrenatural da vida de uma nação, pois é como exilar a alma do corpo, a graça da natureza, o Anjo de nossos passos. E quando isso ocorre, os países caem desabados e tombam sem sentido”.

Hoje vivemos em nossa Pátria uma Revolução que quer destruir todos os valores e esquecer nosso passado. Vivemos uma Revolução que de alguma maneira é mais perigosa que a situação que viveu a Pátria faz alguns anos, quando as guerrilhas armadas queriam apoderar-se do poder para impor-nos a bandeira vermelha do comunismo.Por isso temos que rezar ao Senhor para que nossa Pátria recorde que nasceu cristã, que nasceu católica, como pedia o Padre Alberto Ezcurra aos seus compatriotas argentinos, e que recorde que emergiu da Cruz dos missionários ao mesmo tempo que da espada dos conquistadores.


segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Um líbelo contra a conivência com o crime e criminosos.

Em que pese o crescimento vertiginoso da criminalidade, alguns "iluminidados", seguidores do malfadado "garantismo" penal, insistem em excluir o livre arbítrio da conduta criminosa, e, seguindo a vetusta tese de Rousseau, atribuem a sociedade a existência do delito, uma vez que é a sociedade que corrompe o homem, bom por natureza. Assim se explica os vários casos de impunidade, de punições pifias que no mais das vezes podem ser consideradas "ausência de punição", pela desproporcionalidade entre a pena cominada e a gravidade do delito cometido. Recentemente, na Argentina, juristas de escol lançaram um líbelo contra esta corrente "ideológica" que permeia as universidades, escolas da magistratura etc. No Brasil, dois insignes desembargadores do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de SP, Ricardo Dip e Volney Corrêa Leite de Moraes Jr., denunciaram o caráter "ideológico" por trás do liberalismo penal, ou, melhor dizendo, garantismo penal, em obra conjunta, com o sujetivo título "Crime e Castigo, Reflexões politicamente incorretas", de onde selecionamos os trechos abaixo transcritos.
"a conivência sociologista, que se ocupa em superestimar as causas sociais do crime tem sido um modo sutil de culpar de forma vaga o sistema por todas as mazelas que nos afligem, de sorte que, com isso, fica tudo como está, ou melhor, vai tudo piorando a passos largos diante da passividade generalizada”
[...]

“Em matéria de política criminal, duas grandes vertentes são identificáveis, tendo como divisor de águas a questão do livre arbítrio:
a) (...)
b) autodesignada moderna, que supõe existente relação determinística entre as condições socioeconômicas do agente e a infração;
- seus adeptos acreditam que o crime é produto de injunções materiais, excluída, por conseguinte, a intervenção do livre-arbítrio;
- adotam a convicção, numa espécie de culpabilização coletiva, de que o crime é produto, não do livre-arbítrio do indivíduo, mas das injustiças sociais, pois o homem, no fundo, seria naturalmente bom.
- haveria algo assim como férreo, rígido fatalismo por sob a conduta criminosa, tal significando que a vontade do rapinante e do extorsionário, cujas condições materiais de existência não foram especialmente satisfatórias, seria absolutamente impotente diante do irresistível magnetismo exercido pelo proveito ilícito; eles não teriam liberdade de consciência".

“Na promiscuidade de um barraco, na angústia da fome, no desespero da orfandade, na escuridão do analfabetismo, na visão de um futuro sem redenção, semelhante ao passado brutal e idêntico ao presente asfixiante, seria uma idiotice ver condições adequadas ao pleno florescimento e ao
desembaraçado exercício do livre arbítrio".

“Mas é distorcido afirmá-lo impossível, vê-lo natimorto, quando se tem maciça evidência estatística de que, não o tendo perdido, a quase totalidade dos despossuídos resistiu à tentação de obliterar seus sentimentos de respeito ao próximo".

“É atitude de néscio asseverar que a vontade nada tem a ver com a situação concreta em que se plasma e com as situações concretas em que se exterioriza".

“Porém, afirmar a existência de liberdade de escolher entre isto e aquilo nem de longe é pretender que a soberania da vontade seja quimicamente pura e que a preponderância da vontade não esteja sujeita a turbulências gravitacionais. Não há tal coisa. Há, indiscutivelmente, condicionantes (da mais variada natureza) da liberdade volitiva".

“Mas se é certo que as condições limitam a vontade e conformam o seu exercício, é não menos verdadeiro que de nenhum modo substituem a própria vontade no conteúdo nuclear da ação. Elas, as condicionantes, têm o poder de dizer à vontade como ela pode se manifestar, mas não têm o poder de determinar o que ela deva ser".

[...]
“Equacionando o problema em termos simples: a miséria predispõe ao crime, mas não o engendra mecanicamente. O livre-arbítrio é o fator determinante. Para a grande maioria das pessoas, é o fator de sublimação (em linguagem psicanalítica) da predisposição negativa.
Para inexpressiva minoria, é o fator de rendição, de submissão, de sujeição às solicitações do meio socioeconômico.

“(...) Pois bem, o banimento, a proscrição do livre arbítrio da ordem de considerações fundamentais na concepção de política criminal tem como corolário substancial modificação na idéia de pena: ela se despe da finalidade reprovativa – na verdade, reprovar o quê, se a conduta transgressiva tem conteúdo fatalista? – e ela se despoja da finalidade preventiva, inibitória, dissuasória, intimidativa – na verdade, prevenir o quê, se o criminoso está destinando inescapavelmente ao crime, de sorte que lhe resulta quimicamente estéril, inócua, inconseqüente a condenação de terceiros?

“Um excêntrico personagem, de que até agora só se vira a ponta do nariz a sair dos bastidores, abandona a timidez e entre em cena: o niilismo penal.”

[...]

“O Direito de Punir tem um halo de transcendência, porque sua concretização traduz a reafirmação dos valores fundamentais em torno dos quais se organiza a convivência social.
Valores que o criminoso não apenas ignora, mas agride; não apenas despreza mas profana.
Na intersecção do Mal necessário (a legítima defesa do homem pacato) e do Bem atuante (a reação à ética do crime), o Direito de Punir, por óbvio, deve ser exercido nos limites da Lei e na justa medida, precisamente em atenção àqueles valores, entre os quais se destacam, para o efeito, os relativos à superação da vingança e à regra summum ius summa iniuria. Também por respeito a eles, o Direito de Punir não há de ser aplicado:
a) com regozijo, - obliterando os favores que a Lei consente -, porque isso é sadismo; b) com o acanhamento de quem pede desculpas por um gesto indecoroso, - prodigalizando mercês que a Lei não oferece e a gravidade do delito não comporta -, porque isso é abjeto.
Sim, abjeto.
Porque duvidar da justiça da condenação na conformidade das evidências e nos moldes da lei, e ainda assim punir, é burocrática covardia.
A condenar com vergonha é preferível absolver com desfaçatez.
Não punir quando era o caso, é caso de assombro, espanto e pasmo: sensação de que a Justiça, existente embora, não foi realizada no caso específico. Mas punir timidamente, quando era caso de estabelecer uma justa proporção entre crime e pena, é caso de escândalo, indignação e anátema: sensação de que a Justiça existe apenas como farsa”.


(Crime e Castigo, Reflexões politicamente incorretas, Millenium, 2ªedição, 2002, Pgs. 9, 19 e 20)

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Os poetas assassinados

Por João Bigotte Chorão

A revolução francesa que transportava nos flancos a arbitrariedade e a injustiça, a libertinagem e a tirania, a violência e o sangue, condenou à morte o poeta André Chénier. A revolução russa, conduzida também sob o signo do ódio, só não levou ao cadafalso Maiakovsky porque o poeta, desiludido e desesperado, se deu à morte.
Nascida do terror da revolução francesa, a época contemporânea recorda a sua origem sanguinolenta na sistemática perseguição aos poetas que denunciam os mitos modernos.
Condenado à morte o jovem poeta como Chénier, Brasillach evoca na prisão com um frémito de ternura e orgulho aquele que o antecedeu no martírio.
Outros, se lhes foi poupada a vida, sofreram no entanto a perseguição e a calúnia. Basta lembrar os nomes de Ezra Pound e de Vintila Horia.
Declarado louco (pois é loucura denunciar neste tempo o materialismo capitalista e a impostura democrática), Pound conheceu o cativeiro e o insulto do manicómio.
“Era impossível viver nos Estados Unidos fora de um manicómio”, dirá lucidamente esse europeu nascido na América.
Fiel como Claudel e Eliot à Lição de Dante, Pound escreveu os Cantos, grande poema em que colaboraram céu e terra. Para entendê-lo na sua extensão e profundidade, é preciso saber várias línguas vivas e mortas, conhecer a Bíblia e a Comedia, estudar História e Economia, ter alguma notícia de poesia chinesa e de pintura italiana, ser destro em armas, esperto em letras, experiente da vida.
Vintila Horia, escritor romeno de expressão francesa (como Gheorghiu e Cioran), bebeu as lágrimas do exílio e o sangue das feridas. Intelectual das direitas — como a si mesmo se definiu — que guardou fidelidade à tradição latina e cristã da Romênia, adversário do regime que humilha o seu país, Vintila Horia foi vítima da coligação marxista e democrática. Distinguido em 1960 com o Prêmio Goncourt, o escritor romeno renunciou a ele depois de uma campanha caluniosa.
No martiriológio nacionalista, dois nomes concitam a nossa emoção e o nosso fervor: o de José António e o de Robert Brasillach. Ambos réus de um julgamento iníquo, ambos serenos na morte, ambos sacrificados na juventude pelos seus ideais.
Para o caudilho e para o escritor a política era uma forma de arte. Em José António, a política sublimava-se na poesia, em Brasillach a poesia comprometia-se na política. José António foi um poeta que se realizou na acção política, Brasillach um militante que se realizou na criação poética.
A clareza de pensamento, a transparência de estilo, o exemplo de juventude, o teor de vida, o entendimento da pátria, tais são alguns tópicos das personagens fraternas de José António e Brasillach.
Numa página admirável, falou José António de um paraíso difícil guardado por anjos com espadas de fogo. Um paraíso proibido aos invertebrados e prometido aos guerreiros. Um paraíso, como o islâmico, em que se descansa à sombra das espadas. Um paraíso onde não é difícil imaginar, vertical e luminoso, o poeta Brasillach.


segunda-feira, 12 de outubro de 2009

A geração hobbit


"Tolkien nunca participou em política nem expressou convicções definidas; tão pouco ‘O Senhor dos Anéis’ pode ser reduzido às categorias políticas em uso: nem ao debate político dos anos 1940-1950, nem ao de 2001. Mesmo assim, não pode negar-se um fato evidente: nem Tolkien nem a sua obra escrita podem ser consideradas neutrais perante os episódios fundamentais do nosso tempo.
Gandalf está vivo e luta conosco’: não é um mote surrealista, mas um lema político do início dos anos 70, imediatamente após a primeira tradução italiana de "O Senhor dos Anéis". Já então, na Península Itálica, se compreendera a militância estrutural do mundo de Tolkien contra a evolução do mundo moderno e em defesa, em entre-linhas, de determinados princípios: sacrifício perante o hedonismo, família e comunidade contra o individualismo, fidelidade e integridade frente ao transformismo, tradição e respeito perante a mecanização, ecologia e lei natural perante a exploração da Terra.


Gandalf, como o seu criador Tolkien, não é de direita. Nem de esquerda. Representam simplesmente a denúncia dos males da sociedade de consumo. E uma alternativa ética, mesmo que não necessariamente política e ideológica. Em muitos e distantes países, uma minoria de jovens - sempre jovens, independentemente da sua idade e sempre rodeados por jovens cronológicos - adotou Tolkien como bandeira de protesto, ou apenas como símbolo de uma opção de descontentamento pessoal.(...) Falamos dos jovens de todas as idades que participaram nos já longínquos ‘Acampamentos Hobbit’, que ouviram a diferente música da ‘La Compagnia dell'Anello’, que utilizaram os nomes de ‘Eowyn’ ou de ‘Erebor’ para as suas iniciativas culturais. Uma juventude diferente, dissidente, minoritária e mais disposta a seguir um mito literário anti-moderno que a submeter-se às modas dominantes. Uma juventude quase marginal, mas viva e real, surpreendentemente consciente da sua identidade comunitária e difusamente disposta a uma luta quase espiritual num mundo pouco inteligível como o contemporâneo. Haverá uma ‘geração hobbit’? Nas atuais circunstâncias, os valores de JRR Tolkien não podem chegar a ser socialmente dominantes. A sociedade ocidental baseia a sua organização nos princípios mais opostos. Vivemos entre Morgul e Mordor. Mas continuará a haver dissidentes, que aspirem a viver em Hobbiton ou em Lórien; e, logicamente, a difusão cinematográfica do mito favorecerá que essa minoria cresça, porque haverá um maior segmento da população exposto à inegável beleza desse mito. Com este filme poderá haver mais hobbits, mais jovens de espírito em luta estética contra as injustiças do presente.
Aconteça o que acontecer, JRR Tolkien não passou pelo Mundo sem deixar uma firme recordação.»

Pascual Tamburri

terça-feira, 29 de setembro de 2009

Liberdade sexual?


"Dentro de alguns anos, sem dúvida, passar-se-ão licenças de casamento como se passam licenças de cães, válidas para um período de doze meses, sem nenhum regulamento que proíba a troca de cão ou a posse de mais de um animal de cada vez. À medida que a liberdade econômica e a liberdade política diminui, a liberdade sexual tem tendência para aumentar, como compensação. (…) Juntamente com a liberdade de sonhar em pleno dia sob a influência de drogas, do cinema e da rádio, ela contribuirá para reconciliar os súbditos com a servidão que lhes estará destinada."
Aldous Huxley: in prefácio de "Admirável Mundo Novo" (1946)

http://infoinconformista.blogspot.com/

segunda-feira, 13 de julho de 2009

PROMISCUIDADE INSTITUCIONALIZADA

Fernando Rodrigues Batista
"O amor está tanto mais doente quanto nossa civilização se tornou mais afrodisíaca". Henri Bergson.

Acabo de ler o editorial de um jornal local – cujo nome não cito propositalmente – onde sob o título “Aids e infância”, apresenta dados oferecidos pelo Programa Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e AIDS do Ministério da Saúde o qual divulgou que em torno de nove mil crianças e adolescentes convivem com a AIDS, no Brasil.
Ressalta o próprio editorial que “adquiriram a doença ainda no ventre materno ou por relação sexual precoce”, para depois dizer que há muito a se fazer em relação a políticas públicas, dirigidas a este público. E por fim exige: “O Estado precisa ser arrojado nas políticas públicas, a família se fazer presente, a escola fazer sua parte a igreja precisa absolver a camisinha”.
Pois bem! O interesse repentino pelo assunto ora em questão, pelo mencionado jornal, decorre das críticas feitas ao malfadado “Caderno das coisas importantes”, que faz parte do programa “saúde nas escolas”, projeto dos Ministérios da Saúde e da Educação do Governo Federal que conta com o apoio da Unicef e da Unesco, órgãos ligados à ONU. O “Caderno...” é destinado a estudantes entre 13 e 19 anos.
Segundo o Ministério da Saúde, o objetivo central do programa “saúde nas escolas” é a promoção da saúde sexual e da saúde reprodutiva, visando reduzir a vulnerabilidade de adolescentes e jovens às DST, à infecção pelo HIV, à AIDS e à gravidez não-planejada, por meio de ações nas escolas e nas unidades básicas de saúde.
Uma breve leitura do denominado “Caderno das Coisas Importantes”* levará o leitor a facilmente concluir que o mesmo se reduz a incitar em todo momento o adolescente à prática sexual, porém ressalvando que existem doenças sexualmente transmissíveis e gravidez “não planejada” dela decorrentes e a apresentar (ainda que em linguagem vulgar) um “elemento mágico”a camisinha - que vai “livrá-lo” destes “inconvenientes”, mesmo que para isso tenha que “omitir” que esta “informação” é fraudulenta.
O Ministério da Saúde e da Educação com a pretensa finalidade de combater uma enfermidade física, não repara (ou repara e este seria o pano de fundo por trás do programa?) na enfermidade espiritual e metafísica da permissividade.Negrito
O ato sexual, consoante o “Caderno das Coisas Importantes” é isso: gozo e satisfação. Este é o sexo como faculdade ginástica. Banaliza-se a sexualidade ao incitar sua prática precoce (não era essa uma das razões do alto índice de crianças e adolescentes com AIDS entre nós?), que a limita, a uma mera gestualidade física.
Este ato sexual tem apenas dois problemas, como mencionamos: a AIDS, que é mortal e a gravidez adolescente "não planejada", que é social, já que deixa como conseqüência, o aumento de famílias monoparentais, visto que o programa governamental não educa o adolescente no sentido de buscar uma relação duradoura e permanente, baseada no amor, mas sim uma relação fugaz e passageira (“ficada” como ensina o próprio “Caderno”), baseada no prazer individualista.
Assim, se o ato sexual é apresentado desvinculado da fecundidade (que é sua finalidade precípua, queiram ou não os hedonistas estatais), através de uma relação duradoura e permanente, e reduzido única e exclusivamente ao prazer momentâneo, através de relações relâmpagos, então, se dá a nivelação de todas as experiências sexuais.
O igualitarismo neste domínio faz com que todas - experiências sexuais - tenham o mesmo valor. As relações heterossexuais, homossexuais, bissexuais, auto-satisfações (masturbação), tornam-se equivalentes. Tudo está permitido em função do maior gozo.
Acerca da masturbação, o “Caderno...” ensina de forma pormenorizada como fazê-la e a qualifica como natural.
Nesse ponto cabe transcrever a penetrante análise feita por C. S Lewis sobre este hábito: “Para mim o verdadeiro mal da masturbação consiste em que toma um apetite – que legitimamente usado faz sair o individuo de si mesmo para completar (e corrigir) sua própria personalidade na de outra pessoa (e em ultimo término nos filhos e netos) – dirigindo-o em sentido contrário, para a prisão interior de si mesmo, para criar um harém de noivas imaginárias. Neste harém, uma vez aceito, resiste a abandoná-lo para sair e unir-se verdadeiramente com uma mulher real. Porque tal harém se encontra sempre a mão, sempre dócil, não exige sacrifícios nem renúncias e pode ser adornado com atrações eróticas e psicológicas com as que nenhuma mulher real pode competir”.
Corroborando a tese de Lewis, o filósofo francês Gustave Thibon salientava que já não sabemos ser fiéis porque não sabemos sacrificar-nos. E acrescentava o autodidata camponês:
"Tantos homens há que só amam pelo prazer imediato... CondenItálicoam-se, deste modo, a conhecer apenas a superfície do objeto amado, e, quando esta superfície os desilude, a trocá-lo por uma outra superfície, e assim por diante. Mas aquele que quer saborear a profundidade de uma criatura deve saber sacrificar-se por essa criatura; o seu amor deve superar as decepções, superar o hábito; mais ainda, deve alimentar-se dessas decepções e desse hábito. O amor humano tem a sua aridez e as suas noites; também ele não encontra o seu centro definitivo senão para além da prova sofrida e vencida. Mas, uma vez chegado a esse ponto, ele saboreará a riqueza, a pureza eterna da criatura pela qual se imolou. Porque, se a criatura é tremendamente limitada em superfície, é infinita em profundidade. É profunda até Deus".
O ato sexual não se esgota em si mesmo como sucede com “os outros gozos”: uma boa comida, uma peça de teatro ou um filme, a observação de um quadro ou uma escultura, ou ainda a audição de uma boa sinfonia.
A sexualidade plena exige a existência de um projeto. O sexo exige fecundidade, que por sua vez não se limita a fecundidade física, senão a um projeto em conjunto de construir um futuro (fecundidade existêncial). Aqui, o sexo abre o sentido da vida em comum (de forma duradoura e permanente).
O sexo ocasional, passageiro ou prostibular, termina no sabor amargo de encontrar-se em uma solidão maior após sua consecução.
Nesse sentido, o “Caderno das Coisas Importantes” constitui-se em um atentado contra o adolescente por privá-lo de descobrir esse mistério da sexualidade em sua integralidade e em seu devido tempo, incitando a prática precoce do ato sexual em sua forma mais baixa e promiscua: o puro prazer egoístico, o qual, diga-se de passagem, não “reduz a vulnerabilidade de adolescentes e jovens às DST, à infecção pelo HIV, à aids e à gravidez não-planejada”, como “pretende” o Governo, mas sim, ao revés, a acentua de forma considerável.
Alias, cabe salientar ainda, que programa análogo e com a mesma finalidade ao do Ministério da Saúde e da Educação foi rechaçado pelo senado da Índia. Curiosamente, o programa de educação sexual que se queria impor nas escolas indianas, teria por base materiais provenientes da UNICEF, um dos órgãos internacionais, juntamente com a Unesco, que apóia o programa brasileiro.
Para o Senado hindu, caso fosse aplicado o programa proposto, ele “corromperia a juventude indiana e levaria ao colapso o sistema educacional”, e ao contrário de sua “pretensa” finalidade, "só exacerbaria as gravidezes prematuras e incitaria a promiscuidade sexual", pois tal programa se reduz a incitação à "educação para usar preservativos" que produz uma
"sociedade imoral".
É o que vai acontecer em nossa pátria se não se proliferarem as ações no sentido de impedir que o “Caderno das coisas importantes” continue a ser distribuído nas escolas da rede pública de ensino. É o famoso remédio de efeito retardado.
Por fim, somos obrigado a concordar com o matutino local quando este afirma que um dos fatores que mais contrubuem para alto índice de crianças e adolescentes com AIDS é a prátca precoce do ato sexual.
Pois bem! Como está informção é oriunda do Ministério da Saúde e este, por sua vez, junto com o Ministério da Educação, é responsável pelo programa "saúde e prevenção nas escolas", do qual faz parte o "Caderno das Coisas Importantes", que está sendo introduzido nas escolas da rede pública de ensino concomitantemente a "máquinas de preservativos" (como pretende o programa), que serão distribuídos como "balas" para crianças e adolescentes, sou levado a concluir, por questão de lógica que: o Governo Federal, antes de contribuir para a erradicação, está ao revés, "de forma consciente", contribuindo para a proliferanção do vírus da AIDS entre crianças e adolescentes.
Para os propagandistas do hedonismo irresponsável, incluindo o responsável pelo medíocre editorial referido no inicio do artigo, deixo a profunda lição do já citado Gustave Thibon:
"A sexualidade? Esses adoradores desenfreados da carne são, quase sempre, incapazes não apenas de amar profunda e duradouramente, mas até de sentir uma paixão autêntica. A sexualidade — reduzida a seus componentes elementares (e por isso mesmo já desnaturada, pois o homem pode imitar tudo do animal, menos a inocência dos instintos) — não une mais, não vincula mais; é uma troca à flor da pele, um "bem de consumo" que não exige nenhum investimento. Ora, a vida sem preocupações foi sempre negócio dos pobres, não dos ricos.
O que prova o caráter artificial dessa exaltação do sexo é que ela coincide com o desaparecimento progressivo das diferenças sexuais.
Irei mais longe: esse frenesi do sexo, para muitos de nossos contemporâneos, não chega até os atos. É mais uma obsessão do espírito que uma necessidade do corpo: exerce-se (se assim posso expressar-me) por procuração: inúmeros indivíduos buscam no relato ou no espetáculo dos amores dos outros (quer se trate de personagens reais ou fictícios) uma concepção imaginária para a esterilidade de sua própria existência. Assim se explica o sucesso desmesurado do erotismo na literatura (aí se compreendendo as numerosas produções pseudo-científicas consagradas aos problemas sexuais) e em todos os outros meios de informação: cinema, televisão, publicidade, etc. Essa excitação cerebral não conhece limites porque não tem realidade. Tudo é possível, com efeito, no plano do sonho e da ficção. Tal como as proliferações cancerosas em torno do órgão que elas próprias devoram, o erotismo representa a degenerescência hipertrófica da sexualidade normal. Parodiando a frase célebre de Pascal, um jovem filósofo americano escreveu que, no mundo moderno, "a sexualidade tem sua circunferência em toda parte e o seu centro em nenhuma".

sexta-feira, 19 de junho de 2009

A hegemonia marxista

“Na trilha do marxismo caboclo (ou positivismo marxista), que tomou conta do ensino básico e das universidades, tudo passou a ser reinterpretado à luz da surrada dialética da luta de classes. Exemplo desse deserto de conhecimentos são os textos de História, que os nossos adolescentes e jovens vêm-se obrigados a engolir nos colégios e nos cursos superiores. É praticamente impossível encontrar manuais que não deformem a História do Brasil. Á sombra do cosmogônico confronto opressor-oprimido, fatos, processos, instituições e pessoas são arrumados, de forma a comprovar a validade da teoria escolástico-marxista. A realidade que se dane. Vale mais a versão ideológica do que a intrincada complexidade da vida. Como no seio da luta de classes não há lugar para a dimensão pessoal nem para a existencial, o herói, que por essência é a quebra arquetípica do anonimato da coletividade, não interessa. Atores, só a burguesia e o proletariado. A burguesia, tornada substancia na miraculosa reificação da crítica marxista, arrota, oprime, mata, rouba. O proletariado, igualmente coisificado, sofre, se revolta, toma consciência de classe, luta, faz a revolução, se liberta, salva os outros. À maneira das antigas cosmogonias, os dois atores primordiais contrapõem-se como a noite e o dia, o mal e o bem, o nada e o ser. Os atributos positivos correspondem, no caso, ao proletariado e os negativos à odiada burguesia”. Ricardo Veléz Rodrigues, in: Jornal da Tarde (14.X.1995)