domingo, 21 de setembro de 2008

Nação, Pátria e Tradição.

Fernando Rodrigues Batista



Pátria costuma dizer-se do país em que nascemos: terra patrum, e traz a idéia de herança de um patrimônio material e cultural que recebemos dos nosso maiores e devemos conservar e defender para podermos transmitir íntegro aos nossos filhos, assim nos a inteligência máscula de José Pedro Galvão de Sousa.
Nação – do latim nasci (nascer) – evoca a idéia de origem e significa precipuamente uma família histórica. Conclui-se, portanto, que a nação não é simplesmente o povo, não se confunde com o conjunto dos habitantes de um país, nem se reduz à população nacional, é uma categoria temporal e histórica, abrange o ontem, o hoje e o amanhã, eis por que as nações se diferenciam entre si pela tradição que caracteriza a cada uma delas, dando-lhe uma individualidade histórica.
Nesse mesmo diapasão, Plínio Salgado entende por nação a consciência da diferenciação de um povo dos demais povos do mundo. Esta consciência é que dá o caráter da personalidade nacional.
E ainda, acrescenta o autor acima citado, que a nação é, do ponto de vista de sua fisiologia, um conjunto de grupos naturais, criados pelo homem para o exercício de seus direitos e cumprimentos de seus deveres.
Do ponto de vista psicológico, a nação exprime uma consciência de diferenciação histórica dos demais grupos humanos. As pátrias estão localizadas no espaço, sendo que as nações se prolongam no tempo, o primeiro conceito é mais estático, o segundo mais dinâmico.
Pode-se também dizer, em conformidade com a Escola Jurídica Espanhola, que Nação é um conceito histórico, sendo que a Pátria por sua vez é um conceito geográfico.
Le Fur em sua obra "Os grandes problemas do Direito", preleciona que à idéia de nação ou de nacionalidade, que tem em vista sobretudo os homens, - e não somente os cidadãos presentes mas também os de ontem e de amanhã, a idéia de pátria acrescenta a de um território determinado: terra pátria, terra patrum, a terra dos avós, hoje nossa, amanhã de nossos descendentes.
Assim ela pode ser definida, "o lar de uma nação". Mas cumpre não esquecer que o elemento espiritual, o amor dos homens, deve vir antes do amor do solo, elemento material.
A. Massineo, por seu turno, ressalta que a pátria exprime de modo direto e principal, per prius diriam os escolásticos, a terra dos pais, e de modo indireto, por conexão íntima com o primeiro objeto significado, os costumes, as tradições, os homens que a habitam (MASSINEO, A, La Nazione, Ed. Civiltà Cattolica, Roma, 1944, p. 137 e 138.).
Já o nacionalismo, consoante a lição do mesmo autor, é uma virtude moral que nos inclina a amar a nossa nação e a cumprir todos os deveres, que a piedade nos impõe para com todos aqueles que nos são unidos pela identidade de origem e cultura. (ob. cit., p. 139).
Inolvidável, porém, é a passagem luminosa de Bossuet onde enfatiza que, a sociedade humana exige que se ame a terra em que todos juntos habitamos. Olhamo-la como mãe comum e a ela nos prendemos. É ao que os latinos chamam charitas patria soli, o amor do solo paterno. Os homens, sentem-se, com efeito, ligados por fortes laços quando pensam que a mesma terra que os suportou e alimentou vivos os receberá mortos em seu seio.
Consoante os parágrafos acima delineados, vislumbra-se que uma das realidades mais humanas e dinâmicas que podemos encontrar é a da nação.
Pela idéia de "nascimento" que expressa, a nação nos fala de um "encadeamento de gerações" na transmissão da vida, ou seja, nos fala de tradição. Daí o porque Francisco de Elias Tejada y Spinola definir o patriotismo como sendo o amor à essência de um povo, isto é, à sua tradição.
Impossível o nacionalismo sem patriotismo, pondera Plínio Salgado, como impossível é o patriotismo sem amor à Tradição, logo, a Tradição, sendo fonte da própria Nação, é fundamento do patriotismo, que dinamiza o nacionalismo, ou a empresa lançada para o futuro.
A importância da Tradição é forçosa se se pretende manter a personalidade das Pátrias, que sem ela estas deixariam de existir, em consonância com a lição de Pemrtin, segundo o qual "se é tradicionalista, não por gosto, mas porque não há outro remédio senão apoiar-se em nossa própria substância, em nossa personalidade, se se quer meramente ser".
Nesse sentido é que o professor Tejada prelecionava acerca da Nacionalidade: "O essencial é uma comunidade política em espírito; os laços legais nada valem se não interpretam seu conteúdo efetivo de idealidade. Por isso, o problema fundamental de um governante é, precisamente, este de forjar e manter essa unidade de espírito que faz as empresas nacionais".
Este ambiente é o que em nosso pensamento político emanado de um substrato católico é conhecido como Tradição, e que levou o insigne jurista espanhol Miguel Ayuso Torres a afirmar que os povos não são "nações", são "tradições". É um amor de agradecimento. E é um dever de não dilapidar o patrimônio que nos há sido legado. Gérman Doig já dizia que não se pode viver com coerência o presente e menos ainda construir o amanha se se perdem as raízes (..) Não existe desenvolvimento autêntico se se edifica de costas a própria identidade."( DOIG, Germán. América Latina, Identidad y Destino, VE. N° 44 Dic. 1999, p. 22).
Antônio Sardinha, relembrava o ensinamento do neto de Renan: "é preciso tomar o partido dos nossos Maiores contra o partido de nossos Pais". Ao que acrescentava o inolvidável mestre português: "tomar o partido de nossos maiores é reconciliar-nos com a essência da Pátria, - é integrar-nos na seqüência tradicional do nosso passado de ocidentais...".
Tradição é o caráter da Nação. Leciona Plínio Salgado que, assim como para o homem isolado, o caráter é a memória de cada ato individual e do conjunto dos atos individuais na sua vida de relação com outros homens e com o conjunto social, informando permanentemente o "fazer" e o "que fazer" no presente e no futuro, também o caráter de uma Nação consiste nessa faculdade de lembrar, de trazer em dia as atitudes pretéritas, para harmonizar o que foi, o que é e o que virá, num sentido de afirmação de personalidade.
Na mesma linha de raciocínio, a Nação para José Antônio Primo Rivera é irrevogável, isto é, que a Tradição que a constitui não pertence a uma geração que o tempo leva, porque esta recebeu-a do esforço de gerações anteriores e deverá entregá-la como depósito sagrado às gerações que sucedem.
Ao contrário de Primo Rivera, Francisco Elias Tejada, acrescenta que prefere o conceito de usufruto (em relação a Nação), porque esse acervo sagrado do que foi e continua a ser com vitalidade presentes, admite de nossa parte uso e melhoras, porém sempre sem poder abusar, ou como se diz em Direito Romano, salva rei substantia.
Tão íntimos que são o nacionalismo e o patriotismo que João Ameal preleciona que patriotismo é a nossa gratidão à sociedade, que encontramos já pronta a receber-nos, ordenada, regulada, tuteladar, no seio da qual nos formamos e desenvolvemos, pouco a pouco, amparados pelas suas firmes estruturas; com a qual contamos hoje para nos assegurar proteção e justiça; com a qual sabemos poder contar amanhã (visto a sua existência nos aparecer duradoura e estável) para dar aos que nos sucederem os mesmos benefícios que nos deu a nós. Gratidão no espaço – pois estendemos o nosso afeto a toda a vasta comunidade em que estamos integrados; e gratidão no tempo – pois o estendemos também a quantos, nos passado, ajudaram a construir, reforçar, a consolidar o agregado em que nos precederam; a quantos defenderam e aumentaram esse Bem Comum de que somos agora usufrutuários.
E é nesse sentido que, não podemos malbaratar a Nação, nem aliená-la, porque não somos donos absolutos, mas a recebemos como legado vivo do passado para transmiti-la ao futuro.
No mesmo mister, o conspícuo pensador francês Jean Ousset escreveu:
"A nação é a sucessão dos homens da pátria, no passado e no porvir, assim como no presente. Não é o simples total dos que vivem. A nação existia antes deles, e quando eles morrerem ainda sobreviverá. A nação se refere, pois, a aquele que faz a união ou a unidade de um certo numero de gerações em certo rincão do planeta e também, ao que permite dizer que, em determinada região, ou para determinada classe de homens, existe verdadeiramente uma comunidade de mortos e vivos. Por isso, as vezes se nos ensina que o espírito nacional reside primeiramente na consciência de cada um nós." (OUSSET, J. Patria, Nación, Estado, Ed. Speiro, Madrid p. 22-23)
Deve-se acrescentar, porém, que há pátrias (patrimônios) que não souberam guardar, por exemplo, a unidade de sua fé católica, que não conheceram, ou quase, o incêndio, a devastação destas revoluções ideológicas e sociais de que os rancores, os ódios podem tornar-se a todo momento ocasião de divisão dos espíritos e dos corações.
Em outras palavras, se há pátrias (patrimônios) harmoniosas, unas, há as atormentadas. Pátrias em que os valores de vida são continuamente ameaçados pelos valores de revolução e de morte. Pátrias, que atrás de si, arrastam um pesado passivo de culpas ou de erros políticos, filosóficos, religiosos. Daí a lamentação de Ousset ao dizer que há Pátrias que perecem marcadas por Deus, tanto o subversivo e o falso ocupam lugar em sua herança. Pátrias que, em filosofia, em literatura, em religião, não são conhecidas, muitas vezes, senão pelo nome de hereges célebres, escritores corruptores, filósofos subversivos. Pátrias que trazem em si um veneno capaz de provocar a todo momento a desagregação da nação de que participam, tanto os valores dessas pátrias são divisores, destruidores, desmoralizantes.
Palavras profícuas, lançadas como flechas no seio de nossa pátria, fazendo-nos recordar como a herança dos hereges pesa sobre nós.
E nesse sentido é que um brilhante pensador alemão a respeito de seu país, lamentava, após as terríveis conseqüências oriundas do influxo das idéias de Lutero, Kant e do nazismo no seio de seu povo: "Nós sofremos porque os erros que professamos, as falsas religiões que praticamos nos impedem de afastar ou de neutralizar em nosso patrimônio nacional o que significa decomposição, desordem, fome, servidão".
Por derradeiro, conclui-se que se tais elementos devastadores, as falsas religiões, as filosofias deletérias aos poucos vão corroendo a alma nacional, sua essência, sua tradição, alterando sua substancia que nos fora legada por nossos maiores, a Nação deixa de ser Pátria, deixa de encerrar qualquer elemento sagrado, tornando-se tão somente coexistência laica. Daí a pergunta do filósofo tradicionalista espanhol Rafael Gambra: "que sentido tem morrer por ela? Morrer pelo standing, pela segurança social, pelo desenvolvimento econômico? Os objetores de consciência vêm a ser "objetores de lógica", e é preciso dar-lhes razão".
E arremata: "O divórcio já veio. Quem é o Estado Laico para determinar que uma união não indissolúvel seja um contrato imoral que as leis civis não podem admitir? E virá o estatuto dos ritos ocultistas, mágicos, o casamento entre homossexuais e a possibilidade destes adotarem filhos, um estatuto dos toxicômanos. Em nome de quem proibir estas coisas, enquanto não atentam contra os demais em sua vida física?".
Por isso considero que sem dúvidas o homem deve amar sua família, aos mais próximos, a aqueles que hão criado e lhe legaram um ambiente e uma cultura nos quais ele tem se desenvolvido, pois amar à Pátria significa amar à Tradição, e que nosso nacionalismo, tão necessário na hora presente, seja aquele preconizado pelo sociólogo jesuíta Yves de la Brière ( ao menos no sentido em que o conceituou) que se caracteriza como reação do sentimento nacional contra as influências perniciosas que tendam a dissociar a pátria, influências criadas pela ameaça da força estrangeira, pela penetração da finança estrangeira, ou pela difusão de doutrinas e métodos que enervam, desorganizam e fazem esquecer as justas necessidades políticas do interesse nacional, sem todavia, os excessos dos falsos nacionalismos que tantas mazelas trouxeram a humanidade. O verdadeiro Nacionalismo é o escudo do Patriotismo.

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